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Por Hugo Leite

Foto: Divulgação / ASSIBGE
Após protestos dos servidores e sindicatos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO) suspendeu a criação da Fundação de Apoio à Inovação Científica e Tecnológica do IBGE (IBGE+) na última semana.
Em entrevista exclusiva ao Bahia Notícias, Clician Oliveira, integrante do conselho político do Sindicato Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras do IBGE (ASSIBGE), explicou que o surgimento do órgão, nos termos propostos pelo corpo diretivo do IBGE, iria ser um empecilho para a atuação da entidade. Ela pontuou a controvérsia envolvendo a personalidade jurídica do novo órgão.
“O IBGE + é uma fundação pública de direito privado, que foi criada por membros do conselho diretor da presidência do IBGE em setembro de 2024. O registro em cartório foi assinado por este conselho diretor e também pelo curador. O que significa dizer que a União representada por esses membros abriu um CNPJ, que responde ao direito privado e não ao público”, disse a sindicalista, que ainda acrescentou: “Esses conselhos não têm competência legal para isso, a não ser que haja lei específica, com aprovação votada no Congresso Nacional”.
MODELO SEGUIDO
Ela, que é servidora há 23 anos do órgão, revelou que o problema não consiste na criação de uma Fundação de Apoio, que é comum em universidades e órgãos federais, mas sim no modelo estabelecido.
“O texto do estatuto não é de Fundação de Apoio. Vimos isso comparando com outras instituições deste tipo no país. Trata-se de uma cópia do texto da Fundação Nacional de Saúde, que gere os hospitais federais no Rio de Janeiro, e é conhecida por escândalos. Recentemente, houve a contaminação por HIV em transplantes de órgãos. O documento tem um texto impreciso, que na verdade se trata de uma OS [Organização Social]”.
Para Clician, a criação de uma fundação de apoio do modo que foi imposto iria colocar óbices as atribuições inerentes ao órgão e, assim, o descaracterizar como uma entidade da administração pública federal.
“Deste modo, pode atuar como uma intermediária do estado, que pode contratar sem concurso, tem uma política salarial desvinculada do RJU [Regime Jurídico Único]. Funciona como uma empresa. Há um artigo do regramento do IBGE+ que contém as atribuições de realizar todas as funções do IBGE. Isso ocorre com o Butantan que tem 200 funcionários, mas a Fundação de Apoio deles tem cerca de quatro mil. E em decorrência disso, não há mais concursos. O que representa uma clara transferência de serviço público para a esfera privada”.
FALTA DE DIÁLOGO
A servidora, que compõe o conselho curador da nova fundação como estratégia de supervisionar a lisura e transparência do processo, disse que a interlocução da direção do IBGE com os servidores e os sindicatos não foi adequada, e a criação da Fundação gerou surpresa.
“Os sindicatos não foram ouvidos. O presidente do IBGE [Marcio Pochmann] trouxe um projeto de escuta que os servidores poderiam se inscrever. Participei desse grupo, mas não houve muita adesão, porque é difícil para o funcionário trabalhar durante o dia e ainda participar de um projeto dessa importância, dispende muito tempo. E só ficamos sabendo da criação em setembro de 2024, dois meses após a formalização em cartório, que ocorreu em julho”, pontuou.
Segundo a líder sindical, os diversos papeis desempenhados pelo IBGE não são compatíveis com uma instituição privada. “Produzimos um conjunto amplo de indicadores, que são utilizados em políticas públicas. Veja, o número de deputados federais é estipulado com base na nossa pesquisa populacional. Temos a área destinada a cartografia que é fundamental para a região de fronteira. Então, são atividades ligadas a soberania nacional. Imagine esse conjunto de informações serem financiadas por uma empresa privada? São questões caras ao país”, salientou.
De acordo com Clician, o estado consegue ter um maior controle sobre os funcionários, mesmo sobre os que exercem funções temporárias. “É uma questão sensível, pois vai entrar em sua casa um sujeito para colher dados e que não pode ser qualquer um. Deve ser um representante do estado, e este é punido se pisar na bola, já que os agentes de coleta respondem até penalmente por falsificarem questionários”.
bn